
A NATUREZA QUASE HUMANA - 2001, Michel Gondry
Laraia, um importante antropólogo brasileiro, diz que não existe natureza humana sem cultura, ou seria o contrário? Acredita-se que cada situação de nosso cotidiano exige um determinado comportamento, uma atitude “mais humana”, sempre há um correto e um errado. Mas e quando a natureza, o instinto humano, ou que seja talvez animal, fala mais alto? Há corrompidos, ou somos corrompidos pela genética e não temos como escapar disso?
O filme Natureza quase humana (2001), do diretor francês Michel Gondry (Brilho eterno de uma mente sem lembranças, Ciência do sono e etc.), é acima de tudo irônico. É um filme sobre necessidades, ímpetos, sobre o SER humano e toda sua parafernália cultural que criou para se dizer civilizado, correto e no topo da cadeia alimentar.
Três personagens, humanóides sem deixar de ser primatas acima de tudo, focam o enredo. O roteiro é de Charlie Kaufman e não poderia se esperar nada menos bizarro. Kaufman cria diálogos geniais entre os personagens vitimas da humanização de uma sociedade cheia de tabus e desorganizada. Lila (Patrícia Arquette) é uma mulher com problemas hormonais que sofre em não ser uma mulher desprovida de pêlos como as mulheres que o cinema e mídia trazem, ela não entende se deve ser reclusa, longe dos estereótipos, ou ainda se deve se render a sociedade e ser mais uma “uma alma vendida” como ela própria diz. Puff (Rhys Ifans) é um homem criado em meio à natureza crendo ser um exemplar de chimpanzé, ele é o personagem mais interessante sendo o centro da narrativa. Ser um homem? Ser um animal? Não se sabe, apenas pode-se dizer que Puff conheceu a fundo a natureza humana. E Dr. Nathan Bronfman (Tim Robbins) é o cientista maluco por organização e metódico ao extremo que acredita que por testes (estilo Skinner) pode educar ratos a se portar na mesa. E esses três personagens vão ter suas vidas cruzadas e trará a tona o questionamento de como ser humano, ou como não o ser.
Kaufman, como fez em Quero ser John Malkovich, trouxe à tona a questão do ser individual humano, da aparência e da necessidade desta, o filme traz de forma primorosa as questões de corrupção humana e de legados do tipo que os fins justificam os meios, e claro, cenas com diálogos geniais que beiram ao humor negro extremado. Gondry traz uma direção única nos mesmos moldes que continuou fazendo mais tarde, afinal esse seria somente seu primeiro trabalho de cinema “sensacional” que o colocaria no mesmo patamar dos melhores diretores do cinema autoral. Os recursos estéticos utilizados em cenas de flashbacks dão um charme documental ao filme. A narrativa rápida de Kaufman aliada ao tom impessoal de dirigir de Gondry deixou Na natureza quase Humana um filme imperdível e ótimo para boas doses de realidade do que nos tornamos todos os dias.
[Manu]
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